domingo, 15 de abril de 2018

História trágico-marítima (CCLI)


Leixões, Fevereiro de 1923
Mais dias de temporal

Ontem, de manhã, devia entrar em Leixões o vapor “Flandria”, da Mala Real Holandesa, a fim de desembarcar passageiros, vindos do Brasil, o que não fez, devido ao mau tempo e mar, seguindo para Vigo.


Matosinhos-Leça, 8 – Como na madrugada o vento rondasse para sudoeste, caindo por vezes grossas bátegas de água e granizo, deu origem a que o vapor “Figueira” encalhasse próximo do cais do Marégrafo, sobre umas pedras que ali há. A tripulação abandonou o navio deixando as caldeiras acesas!
A totalidade dos sinistros ocorridos desde ontem, até agora, em Leixões, é de 1 iate, 5 fragatas com diversas mercadorias e 1 vapor. De manhã, a praia de Matosinhos era um mar de destroços: barris e caixas de vinho, fardos de algodão, caixas com palitos, pedaços de madeira que o mar, com as suas vagas alterosas, arrojava à praia e que a Guarda-fiscal e alguns marítimos iam juntando à beira da praia.
Entretanto, a Guarda-fiscal provou-se impotente para guardar todas as mercadorias, pois à praia afluiu uma multidão de pessoas, que pretende apoderar-se dos despojos, como se eles fossem propriedade sua. A guarda teve de distribuir algumas pranchadas, e descarregar as suas carabinas; apesar de tudo, o algodão, o vinho e a madeira vão desaparecendo, como por encanto…
O serviço do salva-vidas foi, como sempre, perigoso, mas proficiente e destemidamente desempenhado; durante toda a noite andou a prestar auxílio às embarcações de pequeno calado, surtas no porto.
Cerca das 8 horas da manhã, o salva-vidas a gasolina, andou a fazer preparativos para salvar o vapor “Figueira”, tendo ido um técnico a bordo, com dois rebocadores, surtos em Leixões, para verificar se de qualquer forma, podiam prestar auxílio ao vapor, tendo também embarcado as suas tripulações.
O salva-vidas, pelo constante trabalho que teve durante a noite, sofreu uma avaria no leme, que foi imediatamente reparada.
Um vapor americano que estava em porto nada sofreu, assim como a canhoneira “Mandovy”, por estarem ambos com as caldeiras acesas, as máquinas a trabalhar, e por terem procurado receber fundeadouro.
De manhã, retirou do cais de Leça o piquete da Cruz Vermelha, que permaneceu em Leixões durante a noite, até às 9 horas da manhã, não tendo sido necessário o seu auxílio, por não se terem registado acidentes pessoais.
O vento amainou, mas o mar continua furioso, galgando, dum lado ao outro, os molhes do porto.
O vapor “Figueira” está arrombado.
O iate “Maria Clara”, com carregamento de sal e os lanchões “Boa Esperança”, com trigo, “Tejo”, com algodão, “Guadiana”, com madeira, “Tâmega”, com carga diversa, “Albatroz”, “Europa” e “Feliz”, impelidos pelo temporal, foram todos encalhar no enrocamento do molhe norte, onde se conservam.
(In jornal “Comércio do Porto”, sexta-feira, 9 de Fevereiro de 1923)


Em Leixões
Ainda os efeitos do temporal
No porto de Leixões entrou ontem o vapor salvadego dinamarquês “Valkyrien”, a fim de conseguir pôr a flutuar o vapor “Figueira”, que se encontra encalhado com um rombo.
Ontem, o “Figueira” começou a ser descarregado, para o aliviarem e mais facilmente poder ser posto a flutuar.
O mesmo vapor, com a proa, desmoronou uns quatro metros do cais do porto de serviço, lado Sul.
(In jornal “Comércio do Porto”, Domingo, 11 de Fevereiro de 1923)

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